terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

de olhos fechados

Wang Ningde, Some Days nº25

 
Foi um erro, eu sei, mas não resisti a ler a crónica na Visão, do José Luís Peixoto e a sua cadela, o amor aos cães e... fiquei com os olhos marejados de lágrimas a comer o meu rissol de camarão e a ler aquilo. Tocou-me num ponto fraco. Acabou-se. Já não consigo usar o Peixoto como musa negativa. Adeus Peixoto, olá Gonçalo M. Tavares. Que embuste... Tenho ido ao "chinês clandestino" do Martim Moniz, onde se rabiscam os pedidos em caracteres chineses. Parece um prédio normal, toca-se à campainha e no último andar, um restaurante na sala de jantar cheia de estrangeiros (deve vir nos guias de coolhunting ou o raio). Excelentes guiosas fritas. A sopa ácida-picante, muito boa também, a melhor que já provei, até porque foi a primeira, tudo por preços absurdos (3 euros e meio, 4 euros). Até o Borba fica pelos 4 euros, pouco mais que no supermercado. Assim dá gosto, hoje em dia, a carteira também come. Sempre que leio jornais fico mal disposto. O Jardim Gonçalves garantiu em tribunal a sua reforma de 167 mil euros (mensais) no litígio contra o BCP, isto depois de, com a sua quadrilha ter conseguido sacar 400 milhões em prémios do banco. Pagou um milhão de multa e foi condenado a uns terríveis 5 anos de impossibilidade de exercer funções na banca. Ainda ficou com direito a usar o avião privado, guarda-costas e motorista. E o tribunal deu-lhe razão! Lá terá as suas razões, o tribunal, pois de leis nestes crimes complexos de off-shores e vender gato por lebre em aumentos de capitais, não percebo nada. Só sei que o pretão ladrão que rouba o tostão vai para a prisão e o opus dei lambão que rouba milhão tem direito a avião em vez de fazer companhia ao pretão cheio de tesão e rezar até mais não. É um fundo de pensões do Millennium  BCP que paga a reforma ao Jardim Gonçalves, ou seja,  somos nós, porque 3 mil milhões de euros  de instrumentos híbridos convertíveis (designados, muito acertadamente, CoCos), seguido de um aumento de capital de 500 milhões de euros, são pagos por nós para salvar o banco. As minhas reflexões são demasiado simples. Não se pode chamar filho da puta ao filho da puta, etc. já percebi. Há condicionalismos. A vida do cão do Peixoto vale menos que a do Jardim Gonçalves, li num sítio qualquer, em Portugal até os comunas dizem esse tipo de coisas consensuais para continuarem a ser pagos a peso de ouro por crónica no expresso, a tal ponto é preciso ser-se educado para sobreviver e ser levado a sério. Mais vale viajar de olhos fechados, abri-los para ver coisas bonitas e nunca sair da carruagem.

12 comentários:

Anónimo disse...

é terrível ser-se banqueiro neste país... imagino-os sempre à procura da marca branca nas prateleiras do hipermercado... e eu atrás deles com uma grande barra de ferro e a minha boina à comuna (que às vezes transformo em boina das chéries francesas da resistência :) sonhos...

jj.amarante disse...

É um cliché mas que me parece cada vez mais justo: na sua maioria, os juízes e magistrados portugueses não passam de lacaios do capital, são pressurosos a admitir todos os protelamentos e truques para evitar punir quer os donos do país quer os seus servidores.

MDRoque disse...

Desejar muito uma revolução a sério, com rios de sangue e cabeças cortadas, é insano não é ?

Tolan disse...

Acho que não é nada insano :) O que para mim era impensável há 4 ou 5 anos, agora começa a ser natural... Dou comigo a pensar que toleraria uma revolução nem que tivesse de fazer malas e ir viver noutro sítio, perder muita coisa... só pelo gozo de ver tudo de pernas para o ar. Não a desejo, mas já aqui referi, contudo, que é importante que se sinta que essa hipótese é real. As pessoas têm de acreditar que se chatearem a sério podem mudar tudo, juntas. E o poder tem de sentir que essa ameaça é real e que há limites. De outro modo seremos subjugados até à escravidão.

RedVeil disse...

Pois é Tolan, mas é de olhos fechados que também se sonha.

Anónimo disse...

Não entendi o paralelismo com o Luís Peixoto. Mas acho que isto foi de génio Só sei que o pretão ladrão que rouba o tostão vai para a prisão e o opus dei lambão que rouba milhão tem direito a avião em vez de fazer companhia ao pretão cheio de tesão e rezar até mais não.
No entanto não entendo a questão do fundo de pensões do BCP... como assim somos "nós" que pagamos?
R.

Anónimo disse...

Não entendi o paralelismo com o Luís Peixoto. Mas acho que isto foi de génio Só sei que o pretão ladrão que rouba o tostão vai para a prisão e o opus dei lambão que rouba milhão tem direito a avião em vez de fazer companhia ao pretão cheio de tesão e rezar até mais não.
No entanto não entendo a questão do fundo de pensões do BCP... como assim somos "nós" que pagamos?
R.

Izzy disse...

Acho que ias dar-te bem com a Elizabeth Warren.

Sen. Elizabeth Warren's meeting with bank regulators Thursday left bankers reeling, after she questioned why regulators had not prosecuted a bank since the financial crisis.
"You know, I just want to note on this. There are district attorneys and U.S. attorneys who are out there every day squeezing ordinary citizens on sometimes very thin grounds. And taking them to trial in order to make an example, as they put it. I'm really concerned that too big to fail has become too big for trial," she said. "That just seems wrong to me."

Peppy Miller disse...

a minha pena é que ainda há muita gente a ver a carruagem passar e nada a faz para apanhar;/

Tolan disse...

R, o BCP (e outros) não existiria mais se não fossem as injecções de capital do estado, financiadas com os nossos impostos. Estamos a ajudar um banco que gasta (e a tal é obrigado pelos tribunais) balúrdios por mês com o Jardim Gonçalves e a respectiva quadrilha.

Tolan disse...

Izzy, é que é mesmo isso. To big to trial.

Anónimo disse...

Tolan... por muito que me custe, tenho a dizer que é um pouco simplório a explicação das "injecções de capitais"... conheço a falcatrua da passagem do fundo de pensões para a SS... mas as injecções de capitais?
Well. Não estou a defender o BCP.
R.