terça-feira, 13 de novembro de 2012

então queres ser artista é?

As fases em que somos mais criativos vêm de sentimentos de reacção a algo forte (doença, injustiça, trauma, solidão, uma paixão, um desgosto, a competição com os pares, uma peça de teatro horrível, um livro espectacular) Muitas vezes temos ideias e elas entusiasmam-nos durante um período de tempo. O problema surge quando a execução dessas ideias se expande para lá do impulso.  Temos uma ideia e no dia seguinte, ou na semana seguinte, podemos olhar para ela com estranheza, um bocado como quando temos um sonho e acordamos todos emocionados e depois, ou nos esquecemos do sonho ou então ele já não faz sentido e parece banal, medíocre. E até nos sentimos um bocado embaraçados por ter tido uma ideia tão estúpida ou culpados por ter desistido. A solução implica forçar-nos a trabalhar na ideia, mesmo sem estarmos inspirados ou entusiasmados. É algo muito semelhante a... trabalho. Horror! Muitas vezes pensamos nessas coisas criativas como um escape da mediocridade da vida prática que nos põe euros no bolso no fim do mês e achamos impossível que sejam encaradas como uma obrigação. Mas mesmo que sejamos pessoas muito disciplinadinhas e obstinadas, temos de lutar para não entrar em piloto automático, num modo sonolento e contrariado. Se no trabalho prático nos podemos safar com isto, porque temos tarefas que, no máximo, exigem algo de racional, quando não apenas gestos mecânicos, na criatividade o resultado desta modorra é algo desfocado e sem intensidade. Se o artista tiver espírito crítico vai olhar para o que fez e entra numa espiral que o leva rapidamente a trocar as ideias românticas de criação  por um plácido serão a ver tv. Ao menos assim não está a constantemente a atirar à própria cara de que não passa de um falhado, que devia era deixar-se daquelas coisas e lutar antes por um aumento lá no trabalho. E para agravar tudo, quanto mais espírito crítico um potencial criador tem, mais violento é o seu juízo sobre si próprio e o resultado são prateleiras, museus e salas de cinema e teatro cheias de mediocridade e uma Internet, bares e cafés cheios de talentosos ressentidos que se queixam do mundo das artes, dos seus embustes e de quem os coloca num pedestal. Sim, tudo é feio, sem sentido e o desespero e a amargura apoderam-se do nosso criador. Bem, as coisas são o que são e não dependem do juízo que se faça delas podia dizer-lhe. Nem o mundo é perfeito, nem é completamente injusto e o ressentimento é uma combustão lenta que liberta monóxido de carbono no sangue e sufoca as ideias, sobretudo a ironia, a suprema ironia, tão ausente dessa arte opaca, melosa e tétrica que só comove as costureirinhas intelectuais e os críticos que se masturbam com os malabarismos lexicais e inovações linguísticas e os filmes livres de argumento com actores com cara de peixe morto a contemplar o vazio e as fotografias desfocadas de partes do corpo e a peça de teatro que desafia o público a libertar-se do convencionalismo burguês de procurar sentido e diversão naquilo tudo. Não, a culpa e o mérito são sempre do criador porque tem o tempo do seu lado e em liberdade ninguém o proíbe de tentar de novo. O principal inimigo do talentoso é única e exclusivamente a preguiça. Há tanta coisa melhor para fazer. Mais divertida. E no fim morremos todos, qual é o objectivo? De qualquer forma nunca virá um sentimento de realização, de "já está, posso morrer em paz" ou "sou bestial". Se ele faz algo de bom, ou que os outros dizem que é bom, o mais normal é ficar ficar torturado pela perspectiva de nunca mais fazer nada de jeito para o resto da vida. Que rica recompensa. Então, boa sorte! :)

20 comentários:

Izzy disse...

Oh Tolan, pelamordedeus pa! Tu nao te desgraces! Descalca la as tuas botinhas e nao te afogues em "self pity". O que tu atingiste nao eh pra todos. Eu, como a pessoa menos criativa ah face da terra, incapaz de alinhavar dois paragrafos, coloco a teus pes a minha admiracao (mesmo que o romance seja uma valente porcaria, o que duvido a julgar pelo conteudo deste blog).

E sinceramente, esquece a via tradicional das editoras. Self-publishing, social media marketing, o caminho eh por ai. A malta compra ja o teu e-book. Olha que ate o Hemingway auto-publicou as primeiras obras... E nao havia internets, nem blogs, nem facebooks ou twitters.

E ja agora recomendo, para quem nao conhece e procura um outlet criativo e domina o ingles, participem no Amazon Studios, http://studios.amazon.com/. Quem sabe o teu romance nao acaba em filme?

disse...

assim se explica que se guardem pastas e pastas no computador com textos que nunca acabaram, porque se perde a tesão do mijo ao fim de 7 linhas. da minha parte, parte dos textos que publico são falsos, começaram cheios de seiva criativa depois canso-me, gravo como gravo tanta merda inútil, mais tarde encontro-os por acaso e chamam-me a atenção, talvez por estar outra vez próximo do espírito defeituoso das drogas estupidificantes, de que não preciso para lá chegar, são revistos, reescritos, redireccionados, até não sobrar palavra ou intenção do texto original. são cosmética sobre algum laivo de criatividade e impulso que existisse. reconheço bastante bem essa altura em que escrever se torna trabalho e não prazer, até por causa da merda da minha tese, é um arrastar do texto até a um objectivo que já perdeu o foco, sobrepõe-se as ideias porque nenhuma é suficientemente boa para prevalecer, acabo por escrever mais do que queria e passo o resto do tempo a limpar o texto até ficar um cagalhão de forma delicada com umas ideias soltas e uma punchline que eu não esperava de início. depois apaixono-me por uma merda que acabou por me surpreender, provavelmente só porque a dei por acabada, e publico, e contemplo a genialidade, e no dia seguinte torna-se claro a merda que é, ou pelo menos o grau de banalidade. quase desprezo as pessoas que gostam do meu blog.

disse...

entretanto perdi o fio à meada do meu comentário, mas é o que acontece quando escrevo sem dormir pelo meio.

Tolan disse...

:)) Zé, o teu blogue é genial. E selecto. Por algum motivo obscuro não o consigo adicionar na minha barra lateral! quando tento fazer "guardar" ele não aceita, o grande arrogante.

Izzy, não é self pity nenhuma, hmm... quis só partilhar uns pensamentos, sei que o mundo está cheio de "Zés" e "Tolans" e afins. A única artista que conheço é a Plaft que vive disso desde os 16 anos e que à custa disso desenvolveu reflexos como arrancar-me um Atum Bom Petisco das mãos porque o do Dia% é mais barato e vamos passar fome um dia se comprarmos sempre o atum de marca.

Tolan disse...

...e diz disparates como "não é preciso ter um BMW para se ser feliz."

Talvez tenha razão. O Mercedes SLK200 novo também é bem giro, não tem de ser um BMW. Dois prémios literários e Vrrrm vrrrm, tudo fica bem de novo.

disse...

o motivo obscuro é que ele já lá está, eu vejo-o, ali em cima da Cotonetes Van Gogh. peço desculpa mas o meu blog é mesmo selecto e não tem barra lateral para adicionar o teu, tem seguidores, remasterizados recentemente mas estão pouco acima do disclaimer na hierarquia do bicho.

Anónimo disse...

Porra! Muito bom!

"Nem o mundo é perfeito, nem é completamente injusto e o ressentimento é uma combustão lenta que liberta monóxido de carbono no sangue e sufoca as ideias, sobretudo a ironia, a suprema ironia, tão ausente dessa arte opaca, melosa e tétrica que só comove as costureirinhas intelectuais e os críticos que se masturbam com os malabarismos lexicais e inovações linguísticas e os filmes livres de argumento com actores com cara de peixe morto a contemplar o vazio e as fotografias desfocadas de partes do corpo e a peça de teatro que desafia o público a libertar-se do convencionalismo burguês de procurar sentido e diversão naquilo tudo."

Isabel disse...

O Vergílio Ferreira tem uma frase que gosto muito: "Não se diga que um romance é um mau romance, faça-se". Penso que li num dos Espaços do Invisível mas não tenho a certeza. Estou desejosa de ler o teu livro. Boa sorte!

Pipoco Mais Salgado disse...

Tolan, meu caro, antes de mais deixe que me associe a esse seu sentimento de relação directa entre as fases de grande criatividade e o abalo que nos causam as sensações fortes, acontece o mesmo comigo, atinjo os meus píncaros criativos a seguir às vitórias do Sporting e é por isso que as coisas são como são.

O meu caro tem aqui uma bela âncora de vendas do romance, sabe trabalhar como poucos as palavras que galvanizam um determinado target de público e estou capaz de apostar que o romance vai vender bem, havemos de dizer que sempre o soubemos, desde os tempos do blog que sabíamos que tínhamos artista. O problema, meu caro, é a segunda vaga, o que vem depois dos primeiros indícios positivos, o que confirmará se temos homem ou não. E para essa segunda vaga terá o meu caro que trabalhar o público masculino, a nós dá-nos igual que meu caro seja uma alma sensível, interessa-nos saber se domina a arte de pegar um touro sem ser como rabejador, queremos saber se sabe as regras do rugby, não ficamos convencidos se não souber distinguir sem hesitações um Syrah de um cabernet sauvignon.

Ser apreciado pelos do género oposto é facílimo, basta saber jogar xadrez e ter uma vaga ideia de até onde podemos desenvolver o conceito de "sentido de humor". O difícil, mas infinitamente mais recompensador, é sermos apreciados pelos nossos iguais (repare o meu caro o orgulho com que olhou para a caixa de comentários e havia um comentário do Zé, aposto que se apressou a chamar a Plaft, nervoso, para confirmar que era mesmo o que parecia, imagino a Plaft numa correria desde a cozinha, a não perceber imediatamente a grandiosidade do momento, mas, finalmente, a servirem-se ambos de conhaque, felizes e orgulhosos).

Finalmente, meu caro, não entregue já as chaves do carro alemão. Creio que não será mais que um 316, quando muito um 318, carro, certamente cinzento, o que pode atenuar a dor da entrega. Ainda assim, veja lá isso.

Um abraço e publique a coisa que eu quero ler isso e abanar a cabeça, apreciadoramente, enquanto bebo o meu Old Bushmills sem gelo.

Izzy disse...

Pasme-se. O Pipoco ja a dar-te o chamado "backhanded compliment", e ainda nem leu a obra! Se por um lado tem a certeza que as gajas, burras e simplorias, o vao adorar ja os machos, cultos e bem formados, ah nao, a esses ja te vais ver ah rasca para agradar.

Pipoco, va-se foder a mais a sua superioridade intectual, seu escanção misogino (ate me dei ao trabalho de ir buscar a cedilha). "sermos apreciados pelos nossos iguais" mas quais iguais caralho! Mas quem se julga o Pipoco? O homem do Dos Equis?

Tolan disse...

Eish, ó Izzy, lighten up, o Pipoco é o Pipoco e always be Pipoco (porque estou a usar tantos anglicismos?!) E mesmo debaixo daquela ironia provocadora acho que ele tem uma certa razão. Nós os homens "competimos" entre nós, sem inveja na maior parte dos casos, mas há sempre uma competição estilo jogo de matraquilhos. Eu sei que se me descair e escrever uma cena do tipo José Luís Peixoto ou Valter Hugo Mãe se calhar o Mais Peor insulta-me com palavras que não conheço, o Capitão Padock retira-me o link, o Zé tem pena de mim, o Pipoco faz o downgrade do meu blogue, o ex vincent poursain faz-se à Plaft, o Alf retira-me do top, o Casanova nunca mais me linka se alguma vez voltar ao blogue, o maradona nunca mais me dedica um tigre, o Patife pensa "grande paneleiro!", o menino de sua mãe posta uma foto de dois gays aos beijos e dedica-ma, o R. vem para aqui falar na sua pretinha e escarnecer de mim, o gajo que me fez os dois headers do blogue processa-me por violação de copyright, etc. etc. e isto já para não falar nos meus amigos que vão passar a encarar-me com alguma reserva e distância e para cúmulo a própria Plaft que me vai receber com frieza e virar a cara para o lado quando a for beijar e dizer-me "temos de conversar" enfim, é o descalabro entendes? Ah sim, claro que para além da Plaft também há uma outra dúzia de gajas fixes que torcem o nariz e nunca mais cá metem os pés, é um facto, só que eu gosto de brincar com outros meninos -_- Não quero ficar sozinho com as leitoras de Valter Hugo Mãe e José Luís Peixoto a brincar às bonecas, com elas a vestirem-me roupas e a experimentarem perfumes e aos saltinhos e palminhas.

Tolan disse...

... enquanto lá fora os meus amigos jogam à bola... Às chuva, na lama. E há uma geleira com minis e tudo... ._.

Plaft, Sílvia disse...

o homem dos esquis, em certo sentido.

Anónimo disse...

Olha, bem vem ao acaso ó Tolan.
Ainda hoje amanheci na Caparica e esfiapei a pretinha. Não fumei um cigarro mas comi bolachinhas do Lidl, cocei o rabo e vi o sorriso da minha mulher.
Liguei o computador e claro, vim ler o teu blog. Caramba, estava para te perguntar como é que posso comprar o livro?
Nunca vais ficar sozinho. Estaremos sempre contigo. Eu pelo menos vou estar sempre a abrir o teu blog. De quando a quando. Ainda hoje abro o "chafarica" e o "sobrecâmara", mesmo aquilo sem estar atualizado.
E admito que pesquiso textos teus ó Tolan. Quando quero exprimir um sentimento ou um ponto de vista importante ou citar um escritor. Pesquiso no google a Keyword e acrescento "tolan"...
O teu blog é uma das doze tábuas.
R.

Anónimo disse...

Ah e ante-ontem já depois de ter afiambrado a pretinha, vim cá ao blog e disse em alta voz à minha mulher: olha o Tolan vai lançar um livro!
Não é que ela deixou cair a terrina com o arroz de pato ao chão?
R.

tata disse...

Nem sei que comente... Vinha lançada despejar aqui bravos, go on tolan, és grande, mas fico sempre acanhada com a tua caixa de comentários... esta necessidade de aprovação dá cabo da minha criatividade

MDRoque disse...

Tolan...:')

Izzy disse...

Too harsh? Desculpa pelos palavroes...prometo nunca mais dizer escancao.

whoa, acalma la os cavalos... Uma coisa eh tu gostares mais de brincar com meninos porque teem pilinha como tu, outra eh separar os generos por niveis de inteligencia.

Anónimo disse...

"And they write innumerable books; being too vain and distracted for silence: seeking every one after his own elevation, and dodging his emptiness"
- T. S. Eliot

"beware those who are quick to censor they are afraid of what they do not know"
— Charles Bukowski

Sou fã do blog. Serei do livro também. A generosidade deste tipo de partilha é, para mim, uma das mais importantes formas de liberdade.
Boa sorte!



Peppy Miller disse...

Lança o livro de uma vez por todas e avisa :)